FLÁVIA CRISTINA ARAÚJO LUCAS
Universidade do Estado do Pará
Flávia Cristina Araújo Lucas is a Professor and ethnobotanist of Biology Department and Curator Herbarium MFS Marlene Freitas da Silva of Pará State University. She followed by a one-year postdoctoral in Ethnobotany History at Coimbra University. Her research interests include Biocultural and Botanical Collection, Biocultural network Science in Amazon region, field work and document the Traditional Knowledge and a database traditional plant use.
Ameaças à Bioculturalidade Ribeirinha do Rio Xingu Frente aos Desafios Impostos pela Uhe Belo Monte, Pará, Brasil
Na Amazônia, as comunidades tradicionais ribeirinhas que vivem as margens do rio Xingu utilizam estratégias diversificadas de subsistência que abrangem o cultivo, a caça, pesca, artesanato, elaboração de utensílios, uso de plantas medicinais, dentre outros, garantindo o sustento familiar e perpetuando saberes associados a seus modos de vida. A despeito disso, são constantes as intervenções territoriais, injustiças e conflitos socioambientais ocasionados pela implantação da UHE Belo Monte no estado do Pará, Amazônia, Brasil, que provocou riscos imediatos que dilaceram a bioculturalidade desses povos. O presente estudo objetivou identificar as atividades socioeconômicas e a situação atual dos ribeirinhos do Xingu que foram deslocados pela construção da UHE Belo Monte, apontando os desafios e oportunidades frente aos danos. Expedições de campo ocorreram no período de 2016 a 2024, além disso, foram acompanhadas reuniões com o conselho de liderança ribeirinha. Realizou-se entrevista semiestruturada com 71 unidades familiares-UF (29 UF morando na cidade e aguardando reassentamento e 42 reassentadas em beira-rio). Houve excursões fluviais, turnês guiadas nas áreas produtivas e levantamento etnobotânico. As famílias que moram a beira do rio Xingu mantem quintais agroflorestais e roçados onde produzem espécies frutíferas, culturas agrícolas, hortaliças, plantas medicinais e ornamentais. A criação de aves é uma atividade essencial porque serve para o consumo próprio e como um pagamento por serviços na comunidade. A pesca é uma importante fonte de renda e obtenção de proteína alimentar. Nas falas dos comunitários, “O ribeirinho é uma mistura, ele é um pouco agricultor, um pouco criador e pescador”, e a implantação da hidrelétrica desrespeitou o direito de vida nesses territórios, ou seja, falta terra para morar, para plantar e para viver. A empresa responsável pela construção deteriorou o patrimônio da ictiofauna (levando a escassez de peixes pelo barramento do rio), perda de ilhas pela inundação, devastação dos açaizais; dificuldade de acesso a sementes e mudas; baixa renda para investimento; falta de apoio e fomento às cadeias produtivas. A efetivação do projeto de reassentamento do Território Ribeirinho, com disponibilização das áreas agricultáveis, ações de incentivo à agrobiodiversidade e o acompanhamento das famílias com tecnologias sociais podem ser medidas que favoreçam a melhora desses cenários e dê proteção a médio e longo da etnodiversidade.
Keywords
Amazônia; Barragens; Populações tradicionais; Sociobiodiversidade; Território.